Este domingo assinala-se, uma vez mais, o Dia da Mãe! Uma data que se reveste de um cariz muito especial para a maioria das famílias. A propósito deste momento, Cristina Santos, Psicóloga e Diretora Clínica da Sintricare, propõe uma interessante reflexão em torno de uma pergunta pertinente: Será que todas as mães conseguem ser mães? Ora, leiam!
“Todos nós nascemos de uma mãe, é uma evidência! Mas nem todas as mães conseguem ser MÃES!
As MÃES que protegem, que cuidam, mas que deixam crescer, que respeitam a
individualidade. Que têm defeitos como todos os seres humanos, mas que o seu afeto em
tantos gestos faz esquecer as suas imperfeições. As que não se amedronta pelas ideias dos
seus filhos e que não há mal em serem diferentes, as que preparam para a vida e não escudam
a cada frustração. As que se tornam mais mães a cada conquista da sua cria.
Pois… nem todos tiveram!
As mães são seres humanos e têm a sua história e quando o peso das suas mágoas, traumas,
dificuldades, frustrações, medos, são o motor consciente ou inconsciente da forma como
agem com os seus filhos e vão interagindo a partir desses lugares obscuros de si … só são o que
conseguem ser!
As mães não são todas MÃES!
Existem seres humanos excecionais, assim também, existem mães excecionais, com isto não
quer dizer que todas são excecionais!
A figura das mães passou a ser idolatrada e é tantas vezes distante das verdadeiras mães…”.
Cristina Santos, Psicóloga e Diretora Clínica da Sintricare
Pela manhã passeava pela estrada e olhava os caminhos que desconhecia, ía atenta para não me perder, seguindo pelo trilho assinalado.
Com atenção focada no que estava à volta, no ranger dos ramos das árvores, no cantar dos pássaros, na variedade de tamanho dos cogumelos que brotavam da terra húmida, nos tons de verde que tornavam aquele lugar singular, conseguia ao mesmo tempo ouvir a minha respiração no silêncio que me envolvia.
Não me esquecia de cada passo que dava porque, ao calcar as pedras irregulares nas quais tantas vezes tropecei, por estas teimarem em não abrir caminho à minha passagem – o que daria muito jeito -, ia sentindo o quanto o caminho era tortuoso! Numa ou noutra vez até me fizeram ir ao chão. Limpava os joelhos e continuava determinada em prosseguir.
Vieram os temporais, as chuvadas intensas, os caminhos difíceis de trilhar, veio a vontade de desistir… mas o sol acabava por brilhar, mesmo que não estivesse visível, aquecia o meu coração e aos poucos envolvi-me naquela paisagem paradisáca e fui-me abstraindo, ao longo do trilho, de tudo o que me rodeava, pois já estava em unidade com o meio.
Um certo dia dei por mim como que obstinada, a caminhar na direção duma pedra que vislumbrava lá ao longe, como se ela me chamasse… cheguei perto e observei… era muito bonita! Via-se que escondia algo dentro dela, algo valioso!
Decidi parar e ficar a contemplar. Passei dias e dias…
O que aquela pedra fazia no meu caminho? E que pedra especial era aquela?
Mais e mais perguntas invadiam a minha mente…
Peguei nela e fechei-a na mão, num gesto que egoisticamente dizia: “és minha!” Não podia perdê-la, queria sentir o que emanava dela.
Fui abrindo a mão aos poucos e permitindo que respirasse, que tomasse forma, que existisse tal como é, com a dureza que a carateriza, porém, com um valor inestimável pela grandiosidade da sua essência.
Ao mesmo tempo observei-a de várias perspetivas, vendo para lá da sua beleza, daquela beleza que todos podem apreciar… Já não está prisioneira do meu olhar, nem do enrijecimento das intempéries…
Guardei essa pedra preciosa junto ao meu coração até hoje…
Todos somos árvores, caminhos, flores, pedras… e Pedras Preciosas!!!!
Era véspera de Natal, dia 24 pela manhã, lá iam eles cumprir com aquela que já era uma tradição da mãe, com os seus filhos e sobrinhos.
Era aquele dia do ano que servia para reforçarem os laços e perpetuar as memórias para toda a vida.
Fizesse chuva ou frio, não era a intempérie que os impedia de fazerem aquilo a que se propunham todos os anos.
Iam com os corações cheios e o porta-bagagem com mantas, roupas, comida, flores…
Para contrabalançar o assalto aos centros comerciais, as compras, os doces, o corre-corre da época, eles moviam-se descompassados, dando tempo ao tempo, vivendo intensamente cada minuto daquele dia e absorvendo cada vivência.
Havia um roteiro pré-definido, em primeiro lugar iam aos cemitérios, onde cuidavam e colocavam flores nos familiares (bisavós, tias e tios) e amigos.
Só essa caminhada realizada entre o frio e o vento – onde habita uma estranha paz e se contavam histórias e se fortificavam as raízes – foi a forma que encontraram de prestar homenagem às suas vidas.
“Conta mais!” Diziam eles, com aquela curiosidade que carateriza as crianças. Via-se nos seus olhos que se construíam em cada memória, em cada história…
A Mãe acreditava que para sermos como árvores fortes que resistem às tempestades precisavam de conhecer cada fio da sua raiz, para que esta possa buscar o alimento que precisa para permanecer robusta e viçosa.
“A nossa vida faz parte de um sistema que se constrói a partir de cada antepassado, onde as suas histórias de vida, os seus segredos, as mortes precoces, a dor, as vitórias e conquistas… tocam no nosso eu…” Estas eram só algumas das muitas explicações que a Mãe dava e que os Filhos e os Sobrinhos escutavam como se escuta uma música que se gosta muito!
“É importante reconhecer a importância de cada pessoa da nossa família, mas chegou a hora de não nos esquecermos de todos os que sofrem e todos aqueles que abdicam das suas vidas para cuidarem dos enfermos e dos desfavorecidos…”.
Esta conversa antecipava a ida à porta do hospital, onde sempre faziam um minuto de silêncio (acabava por ser sempre mais), desejando e enviando toda a energia translúcida das suas almas.
Com sentimento de pesar por todos aqueles que não tinham a sua sorte, continuavam a viagem.
Quando as luzes de Natal já brilhavam nas ruas, entregavam cobertores, roupas quentes e uma pequena ceia a cada sem abrigo que encontrassem…
“Tia, tia, porque está a desfazer o bolo e a dar ao cão?” Perguntava o sobrinho muito triste, ao ver aquilo que entregavam com tanto amor ser dado ao animal.
“Sabes, as pessoas que vivem nestas condições já passaram por muito, é natural desconfiarem das nossas intenções, ou, quem sabe, se quis partilhar com o seu melhor amigo? “ Explicou a tia, duvidando da segunda opção.
Quando caía a noite, de regresso a casa, entre as luzes dos faróis que se cruzavam numa azáfama única, o silêncio imperava, mas o ruído dos pensamentos fazia sentir-se…
Já na consoada e em família, a Mãe sentia que o corpo vivia aquele momento, mas a Alma, essa, leve como uma pluma e sem ninguém dar conta, encontrava-se com o Espírito do Natal e juntos pairavam em cada lugar, revisitavam cada pessoa, viviam de novo cada instante…
Cristina Santos
“Adoro o que faço, porque é parte integrante de mim”
Cristina Santos é a diretora técnica e co-fundadora da Sintricare, a Clínica de Psicologia e Psicoterapia que, desde 2000, sempre na mesma rua de Sintra, se dedicada à promoção do bem-estar psicológico das crianças, jovens e suas famílias.
É Psicóloga, com especialização na área da Educação e Orientação Escolar e Profissional, e também psicoterapeuta. De entre os vários serviços disponíveis na Sintricare, é responsável pelas consultas de Orientação Profissional, Psicologia Clínica e Psicoterapia para Crianças e Jovens, Psicologia Educacional e Reabilitação Cognitiva.
Quando é que decidiu ser psicóloga?
Fizeram-me essa mesma pergunta quando estava a frequentar o Curso de Psicologia, na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (ULHT). Nessa altura tive de refletir sobre o assunto e acho que está na minha natureza. É uma aptidão natural o cuidar do outro, ainda desde os tempos da escola. Já me preocupava com o que faltava ao outro e levava o que era necessário – desde o dinheiro de reserva ao kit de costura. A psicologia surgiu por gostar da área da medicina e já que cuidar, de alguma forma, encaixava em mim.
Por que se especializou na vertente da Educação e Orientação Escolar e Profissional?
Para cuidar e ajudar as crianças a estarem mais protegidas, apesar de não ser um trabalho nada fácil. Entendo-me no mundo das crianças.
Qual a diferença entre a psicologia e a psicoterapia?
A vertente da psicoterapia é muito mais profunda e ligada às emoções do que a psicologia, que também cuida, mas a psicoterapia cuida muito mais. No início da Sintricare, comecei a ter aguma dificuldade em trabalhar a emoção, daí ter completado a minha fomação com a psicoterapia, que trabalha mais o corpo.
Em que altura decidiu fundar em Sintricare?
Logo que acabei o curso, em 2000. Na altura, já se trabalhava muito a área clínica. E como a minha base é a psicologia educacional e gostava de trabalhar com as crianças, enveredei por esta área que, regra geral, é desenvolvida nas escolas. Como é muito difícil entrar e houve muitos anos sem concursos, não quis estar sem pôr em prática o que tinha aprendido. Daí, ter optado por exercer esta vertente que só existe nas escolas, em consultório.
E porquê em Sintra?
Na altura, não havia nenhuma clínica nesta área e, como sempre gostei de Sintra, a escolha foi naturalmente aqui. Aliás, apesar de já ter tido várias localizações, a clínica continua a funcionar na mesma rua.
Qual é o objetivo principal do trabalho desenvolvido na Sintricare?
O centro existe mais no sentido da proteção das crianças do que da prevenção. Quem tem o privilégio de fazer terapia, tem o privilégio de tomar consciência de si. São ferramentas para o resto da vida, porque o trabalho que é feito com as crianças e jovens ao nível da terapia fica neles para sempre.
Ao longo destes 17 anos, a clínica tem sofrido muitas alterações?
Apesar de já ter ido outras valências que deixaram de existir, quer pela crise ou por terapeutas que tomaram outos rumos, a Sintricare tem-me sempre a mim na sua base. É dinâmica, mas nasceu como Clínica de Psicologia, vocacionada para criaças e jovens, e a ideia inical ainda prevalece. Há sempre mudanças, como a Sala de Estudo, que sempre tive ideia de implementar, mas só foi possível o ano letivo passado, graças ao espaço que, atualmente, alberga a clínica.
Quais são as expetativas para os próximos anos?
Gostaria de chegar a mais pessoas e colocar outros projetos em prática com maior dinâmica.
Para si, hoje em dia, qual é a grande dificuldade das crianças e jovens?
São as famílias. De uma forma muito lata, as famílias traduzem a sociedade, que nos está a trazer grandes desafios. A educação de antigamente não é a de agora e os modelos que os nossos pais nos passaram, hoje em dia, já não servem para os nossos filhos. Os pais entre os 35 e 55 anos andam perdidos, com dificuldade em ver o que funciona. Os filhos trazem novos desafios, a escola está desatualizada e hoje têm acesso a tecnologias que evoluem de uma forma alucinante. Nós andamos a encontrar o caminho. Temos dificuldade em ensiná-los, já que muita da educação que damos tem a nossa própria educação como ponto partida. De nada servir, é complicado. Os valores mudam, os pais andam perdidos e as famílias desorganizadas. São os desafios da sociedade em que vivemos, que é muito diferente.
Nesse sentido, como considera que se pode ajudar as famílias?
Individualmente! Cada família é uma necessidade e cada jovem é uma necessidade única e cada dinâmica de cada família é única… Não é possível generalizar. Temos de olhar quase ao miscroscópio para cada pessoa para podermos ajudar efetivamente. É preciso praticar as dicas: mudar hábitos e comportamentos é o mas difícil para o ser humano.
Como se caracteriza?
Sou muito dinâmica, exigente e rápida profissionalmente. Internamente, sou calma, quietinha e capaz de estar muito tempo parada. Dentro de mim, tenho tanta coisa…
O que a faz sentir realizada profissionalmente?
Quando vejo trabalho feito. E isto acontece quando, passado uns anos, me dizem que fez a diferença. Vejo que valeu a pena e dá-me força para continuar. Ajudar os jovens a desinibirem-se, tomarem consciência de si, trabalharem a auto-estima, dar-lhes recursos… Adoro o que faço, porque é parte integrante de mim.
E o que a deixa feliz?
O sorriso, um beijinho, um abraço. Poder fazer isso, faz toda a diferença.